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Mais de metade das estradas portuguesas não estão bem sinalizadas.
Linhas tortas, apagadas, invisíveis ou pouco claras de noite. Marcas que apontam para zonas erradas ou que contrariam os sinais verticais de trânsito.
Estes são alguns dos problemas com que condutores e peões convivem no dia-a-dia nas estradas portuguesas e que foram pela primeira vez sistematizados num estudo hoje apresentado pela Associação Portuguesa de Fabricantes e Empreiteiros de Sinalização (AFESP) e que estima que, em média, mais de metade das vias não cumpram os valores mínimos de retro-reflexão durante a noite.
Este número pode ser ainda mais negro se for tido em conta o “valor característico”, isto é, a média menos o desvio padrão. Neste caso atinge-se 75 por cento de incumprimento – um valor que se baseia nos critérios de exigência em Portugal, porque se olharmos para os níveis europeus o número atinge os 87 por cento.
Apesar de o estudo se ter baseado em 59 troços de estradas dos 18 distritos do país, num total de 2400 quilómetros, os autores acreditam que os números possam ser bem piores já que excluíram, à partida, as estradas que nem sequer tinham marcações.
Quanto ao critério de escolha houve dois: relevância na zona onde as vias se inserem e volume de tráfego. E alguns dos piores alunos foram a Segunda Circular, em Lisboa, e a Estrada Nacional (EN) 8 que liga Lisboa a Torres Vedras. Do lado dos bons exemplos destaca-se a EN4, em Évora.
O coordenador do relatório, o engenheiro João Almeida, explicou ao PÚBLICO que “o principal problema é de noite, por as marcas serem pintadas com poucas esferas de vidro”, o material responsável por reflectir a luz que nele incide e que garante ser “barato”: pintar um quilómetro de uma Estrada Nacional custa cerca de 1200 euros e não é o vidro que poderá mudar o preço. João Almeida mostrou-se especialmente preocupado com a situação numa altura em que “a população está a envelhecer e conduz cada vez até mais tarde”, pelo que sublinha ser necessário garantir que existam condições de segurança para que tal aconteça.
O segredo das esferas de vidro
A sinalização vertical e horizontal funciona como um interface entre o condutor e o ambiente rodoviário, sendo que estas marcas são especialmente importantes à noite. O trabalho, que decorreu entre Janeiro e Maio, foi realizado através da medição dinâmica da visibilidade nocturna das marcas recorrendo a um equipamento que simula o que é observado pelo condutor quando circula com as luzes na posição de médios.
Quanto maior é o número de esferas de vidro – que são medidas numa unidade que se denomina milicandelas – maior é a reflexão proporcionada pelo traço, que funciona como uma lente.
Contudo, há diferentes entendimentos sobre as milicandelas mínimas para uma determinada estrada ser considerada bem marcada. A escala tem cinco níveis que vão desde as zero milicandelas às mais de 300. Este último valor é o escolhido por Espanha, mas Portugal opta apenas pelo segundo nível, que corresponde a 100, e que é o mínimo exigido ao nível da União Europeia.
Convém, no entanto, dizer que o tempo de vida das esferas de vidro é relativamente curto (cerca de dois anos), perdendo as suas potencialidades ao longo do tempo, pelo que se uma estrada foi pintada com 100 ao fim de apenas seis meses já estará abaixo dos mínimos exigidos. Por outro lado, a reflexão é considerada ainda mais necessária nas auto-estradas, vias rápidas e estradas com volume de tráfego igual ou superior a 5000 veículos por dia, quando se considera ser necessário pintar de novo a via sempre que esta esteja abaixo das 150 milicandelas.
A AFESP recomenda, por isso, que o valor seja de 300 ao fim de 15 dias, de 200 ao fim de seis meses e de 150 ao fim de dois anos.
Para o presidente da AFESP, João Neto, a solução está em definir de forma clara critérios mínimos e apostar numa posterior fiscalização como acontece em Espanha. Além disso, gostaria que existisse um “sistema de qualificação para os aplicadores de sinalização horizontal” pois acredita que sem boas marcas será impossível reduzir a sinistralidade para os números definidos na nova Estratégia Nacional de Segurança Rodoviária 2008-2015.
Uma opinião partilhada pelo presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, Paulo Marques, que assumiu ao PÚBLICO que até agora se apostou na quantidade e que “agora Portugal começa a olhar para os pormenores e para a qualidade”. Porém, mostrou-se optimista e convicto que se conseguirá reduzir o número de mortos nas estradas de 850 para 579.
PRÉMIO
Para promover o cumprimento dos objectivos de sinalização a AFESP criou ainda o prémio "Boas Práticas em Sinalização e Segurança Rodoviária".
Com a designação "Sinais Vitais", a iniciativa tem como objectivo seleccionar e premiar o melhor município, bem como o melhor projecto, no que diz respeito ao contributo das autarquias para a melhoria das redes rodoviárias.
O “Melhor Município” destina-se a distinguir a autarquia que em 2009 demonstrar manter os melhores níveis de sinalização e segurança rodoviárias, cumprindo as normas, especificações técnicas e boas práticas aplicáveis, com principal enfoque no investimento nas infra-estruturas e no envolvimento do município em processos de mudança que melhorem a acessibilidade dos cidadãos. Já o “Melhor Projecto” destina-se a premiar o organismo do poder local que apresentar um projecto na área de sinalização e segurança rodoviárias e que se distinga pela dimensão, impacto ou aspectos inovadores.
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